Musealização da Central Hidroelétrica do Caldeirão – Torres Novas //
Recolha de memórias e testemunhos dos trabalhadores
Com o objetivo de conhecermos melhor o funcionamento da central e as dinâmicas laborais e sociais, segue-se o registo do testemunho do Sr. Carlos Cebola, da equipa de manutenção de máquinas da Central:
“(…) Fui admitido, com 16 anos, em 1967, era aprendiz de serralheiro, estive na oficina dez anos, aí o nosso trabalho era fazer postes, furar caixas... Depois passei para a manutenção, para as turbinas. Trabalhávamos por turnos, sete dias de noite, sete dias de dia, sempre seguido, fazia-se o horário da semana inglesa a partir de maio. Aí o meu trabalho era a manutenção e limpeza das turbinas; chegamos a ter um rádio para informarmos das avarias, e comandávamos as linhas de média de tensão para as aldeias através da subestação. Tínhamos de abrir as comportas para fazer a manutenção das máquinas e geralmente a água entrava sempre na casa das máquinas. Lembro-me uma vez, quando aconteceu a cheia grande (1969), aí é que houve uma grande enchente e até tivemos que atender os telefones em cima da mesa... As máquinas eram sempre a nossa maior preocupação e responsabilidade. A manutenção fazia-se constantemente para que não avariassem. A central do Almonda não tinha capacidade para fornecer energia elétrica a todo o concelho, por isso, quando a hidroelétrica faltava tínhamos de fazer o paralelo entre a corrente que vinha do Alto Alentejo e a do Almonda, caso contrário, só havia luz em algumas ruas do centro, na rua da calçada e no hospital. Para ajudar, quando o nível da água estava muito baixo, as turbinas eram acionadas com o motor a diesel, a máquina da grande roda… Eu nunca consegui colocar o motor grande a trabalhar, se ele não arrancasse à primeira, tinha de se pôr um bocado de desperdício de gasóleo. Lembro-me do painel metálico… era para controlar a iluminação pública, estava ao lado do outro painel de pedra, ao pé da roda da turbina. Houve Invernos em que tínhamos de limpar as turbinas três vezes em cada turno.
Na parte social, havia camaradagem. Chegamos a fazer um almoço no 1º de maio antes do 25 de Abril (1974), o patrão sempre foi algo distante, mas... fazíamos almoços, jogos de futebol.... Eram outros tempos. Eu vinha de Alcorochel de bicicleta e o patrão quando se apercebeu nesse dia despediu-me, comecei a chorar porque tinha de voltar para o meu trabalho de antes, que era tirar tijolo do forno. A malta mais velha, defendeu-me e então acabei por ficar. Mesmo assim levei um castigo que foi pôr luzes nos postes, sem escada…”.
Carlos Alberto Carvalho Cebola//trabalhador da manutenção da Central, Alcorochel-Torres Novas, 69 anos