Festejos de carnaval tradicionais – O Dia das Comadres e o Dia dos Compadres
Em Árgea a juventude celebrava o carnaval com vários momentos de divertimento. Alguns, já abordados em publicação anterior, contemplavam bailes entre rapazes e raparigas realizados nas semanas antes do Entrudo, sendo o que o último desses bailes se realizava precisamente na terça-feira de Carnaval, e que terminava obrigatoriamente à meia noite, pois a partir dessa hora começava o ciclo da Quaresma que impunha o fim da folia.
Durante a quadra do Carnaval celebrava-se o Dia das Comadres (as raparigas) e o Dia dos Compadres (os rapazes), o primeiro na quinta-feira antes do Domingo Magro e o segundo na quinta-feira anterior ao Domingo Gordo. Ambos os dias terminavam com um jantar para o qual os grupos, devidamente disfarçados, recolhiam, nas ruas, ovos, chouriço e dinheiro. Além dos comes e bebes dos grupos, separados por sexos, competia aos compadres fazer um monte com os nomes de todos os rapazes e um outro com os nomes de todas as raparigas. Tiravam depois nomes alternadamente de cada monte de forma a constituir pares de comadres e compadres para um ano inteiro. Embora as comadres fizessem o mesmo tipo de sortes, era a lista dos compadres que contava e que era tornada pública, ficando a obrigação social de, pela Páscoa, os compadres oferecerem às comadres as amêndoas e estas retribuírem com um folar.
Também em Carvalhal da Aroeira se festejavam estes dois dias, dos compadres e das comadres, nas mesmas quintas-feiras do calendário, havendo igualmente comes e bebes, tal como em Árgea, separados, rapazes para um lado e raparigas para o outro, e com sorteio dos pares comadre-compadre. No Domingo de Páscoa fazia-se então a oferta das amêndoas ou um lenço ou um par de peúgas.
Esta tradição, que está descrita na bibliografia local, ocorria na generalidade do território nacional, embora com variantes de terra para terra. Por exemplo, o dia das comadres pode ser, em alguns contextos, a quinta-feira antes do Domingo Magro e o Dia dos Compadres a última quinta-feira da quadra, incluir mais dias ou então os folguedos terem lugar no mesmo dia para ambos os grupos, em geral no Domingo Gordo. Ernesto Veiga de Oliveira vê estes divertimentos de Carnaval como a «glorificação do próprio grupo sexual no seu dia respectivo – os homens na quinta-feira dos “Compadres” e as mulheres na das “Comadres” –, e ao mesmo tempo na oposição para com o grupo contrário, traduzindo-se em troças, perseguições ou lutas jocosas, simbólicas ou mesmo por vezes efectivas, e na solidariedade operante entre todos os indivíduos do mesmo sexo em contraposição aos do outro sexo». Simbolicamente, é exaltada a cumplicidade entre pessoas do mesmo sexo e a oposição entre sexos contrários, com a participação e cumplicidade/oposição (conforme o caso) dos mais velhos.
Referências:
Maia, Maria Helena, Manuela Poitout, Luís Batista, Árgea, História e Património. Torres Novas: Município de Torres Novas, 2005, pp. 280, 281
Oliveira, Ernesto Veiga de [in https://books.openedition.org/etnograficapress/5928]
Sousa, Luís Correia de, Carvalhal da Aroeira. A memória de um povo. Torres Novas: Município de Torres Novas: 2012, pp. 230-233
Fotografia: «Desfile de Carnaval no início da década de 70» in Sousa, Luís Correia de, Escrito no tempo. Fotografias antigas de Carvalhal da Aroeira. Torres Novas: Município de Torres Novas: 2012, p. 124