Musealização da Central Hidroelétrica do Caldeirão – Torres Novas //Recolha de memórias e testemunhos dos trabalhadores

Continuamos com a recolha de mais testemunhos de trabalhadores para conhecer melhor o funcionamento da central e as dinâmicas de trabalho. Apresentamos o testemunho do Sr. José Ferro do piquete de eletricistas da Central:

«Entrei para a Central Elétrica do Caldeirão em 4/4/1974 como aprendiz. Tinha feito 14 anos. Nesse dia, fomos ter com o patrão, eu e outros, e como já estávamos a trabalhar há uns meses, decidimos ir perguntar quando é que recebíamos; e depois, a partir daí, passámos a receber ao mês. Na época, no nosso serviço, o concelho estava dividido por zonas. Eu estava na zona de Torres Novas que incluía as freguesias da Ribeira, Zibreira, Brogueira, Alcorochel e Parceiros de Igreja. Era muito trabalho. Fazíamos tudo, desde passagem de linhas, manutenção, instalação de postes, mas estava também ao nosso encargo o serviço das instalações de edifícios públicos, pois a câmara nessa época não tinha eletricistas, por exemplo, realizar as instalações nas escolas primárias. As escolas primárias não tinham luz e fomos nós que as eletrificámos, desde a instalação interior à ligação à rede. Começámos logo, desde aprendizes, com alguns dos mais velhos. O meu mestre foi o Carolino e foi com ele que eu aprendi, com ele e com o Zé Gaveta. Quando fizemos a eletrificação do Outeiro Grande o Zé Gaveta foi o meu chefe do princípio ao fim. Foi uma altura de muito trabalho, mas de muita amizade e camaradagem. Mas, há que dizê-lo, era uma vida muito difícil, porque para além de trabalharmos muito, pagavam-nos mal e não tínhamos horário. Acabávamos o trabalho às 18h, mas se faltasse a luz, que estava sempre a faltar no inverno, ou em caso de avarias tínhamos de resolver. Estávamos sempre preparados para ser chamados e ir trabalhar. Corríamos tudo para encontrar as avarias, e a pé. Fui muita vez da linha da Zibreira até à Brogueira, pelo meio de pinhais, cabeços e vales à procura da avaria, ao encontro do outro colega que estava a fazer o mesmo, mas em sentido contrário. Depois passámos para a EDP em 1984 e mudou tudo, a todos os níveis. Por exemplo nunca me foi possível seguir os meus estudos, algo que eu queria muito, porque faltava sempre às aulas, devido a ter de trabalhar no exterior. Mas fui sempre lutando. De 1984 a 2002 fui fazendo sempre formações e isso depois deu-me algumas mais-valias futuras, pois após 2002, a EDP dividiu-nos para Santarém, Abrantes, Tomar. Eu fiquei em Abrantes para ficar ligado à área do nosso concelho que já conhecia a instalação. Passei a ser o responsável pela área de rede de Torres Novas e fazer o levantamento de toda a rede, para se proceder a tudo o que eram remodelações. Aconteceram-me aí coisas muito engraçadas. Por exemplo, fiquei encarregado de fazer o orçamento para retirar toda a rede e instalação que tínhamos colocado no Outeiro pequeno em 76 e substituir tudo para colocar equipamento novo em 2005, tivemos que desmanchar as redes velhas e fazer redes novas adaptadas às necessidades de potência, principalmente na média tensão. Agora é uma maravilha! Nunca falta a luz.
Quanto à concretização deste museu, quero dizer que é algo importantíssimo para que as novas gerações fiquem com uma mensagem para o futuro, do valor da indústria e do trabalho, numa terra como Torres Novas. Quando abrir o museu vou lá com os meus netos! (…).»

José Ferro
Piquete de eletricistas da Central, 61 anos
Torres Novas